30.8.07

Impressão Digital


Os meus olhos são uns olhos,
e é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos,
onde outros, com outros olhos,
não vêem escolhos nenhuns.

Quem diz escolhos, diz flores!
De tudo o mesmo se diz!
Onde uns vêem luto e dores,
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.

Pelas ruas e estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros gnomos e fadas
num halo resplandecente!!

Inútil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos!
Onde Sancho vê moinhos,
D.Quixote vê gigantes.

Vê moinhos? São moinhos!
Vê gigantes? São gigantes!


António Gedeão

28.8.07

Por quanto é sem fim

youtube

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por casas, por prados
Por quintas, por fontes
Caminhais aliados

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por penhascos pretos
Atrás e defronte
Caminhais secretos

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por prados desertos
Sem ter horizontes
Caminhais libertos

Caminhais libertos

Caminhais libertos

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por ínvios caminhos
Por rios sem ponte
Caminhais sozinhos

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por quanto é sem fim
Sem ninguém que o conte
Caminhais em mim.

Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por prados desertos
Sem ter horizontes
Caminhais libertos

Sem ter horizontes
Caminhais libertos

Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por quanto é sem fim
Sem ninguém que o conte
Caminhais em mim
Cavaleiro monge
Por penhascos pretos
Por rios sem ponte
Caminhais em mim


Fernando Pessoa, in Cancioneiro, 1932