30.10.06

Silentium

Speak not, lie hidden, and conceal
The way you dream, the things you feel.
Deep in your spirit let them rise
Akin to stars in crystal skies
That set before the night is blurred -
Delight in them, and speak no word.

How can your heart expression find?
How should another know your mind?
Can he discern what quickens you?
A thought once uttered is untrue.
Dimmed is the fountainhead when stirred -
Drink at its source, and speak no word.

Live in your inner self alone;
Within your soul a world has grown.
The magic of veiled thoughts that might
Be blinded by the outer light
Drowned in the noise of day, unheard -
Take in their song, and speak no word!


by Fedor Tyutchev
translated by Vladimir Nabokov


18.10.06

You pray in vain when

You pray in vain when you address yourselves to any other gods but your very selves.

For in you is the power to attract, as in you is the power to repel.

And in you are the things you would attract as in you are the things you would repel.


(Orais em vão quando vos dirigis a outro deus que não o vosso ser.

Pois em vós está o poder de atrair, assim como em vós está o poder de repelir.

E em vós estão as coisas que ireis atrair, assim como em vós estão as coisas que ireis repelir.)



Mikhail Naimy, The Book of Mirdad: The Strange Story of a Monastery Which Was Once Called the Ark , 1962.

12.10.06

Se eu fosse eu

"Quando não sei onde guardei um papel importante e a procura se revela inútil, pergunto-me: se eu fosse eu e tivesse um papel importante para guardar, que lugar escolheria? Às vezes dá certo. Mas muitas vezes fico tão pressionada pela frase "se eu fosse eu", que a procura do papel se torna secundária, e começo a pensar. Diria melhor, sentir.

E não me sinto bem. Experimente: se você fosse você, como seria e o que faria? Logo de início se sente um constrangimento: a mentira em que nos acomodamos acabou de ser levemente locomovida do lugar onde se acomodara. No entanto já li biografias de pessoas que de repente passavem a ser elas mesmas, e mudavam inteiramente de vida. Acho que se eu fosse realmente eu, os amigos não me cumprimentariam na rua porque até minha fisionomia teria mudado. Como? Não sei.

Metade das coisas que eu faria se eu fosse eu, não posso contar. Acho, por exemplo, que por um certo motivo eu terminaria presa na cadeia. E se eu fosse eu daria tudo que é meu, e confiaria o futuro ao futuro.

"Se eu fosse eu" parece representar o nosso maior perigo de viver, parece a entrada nova do desconhecido. No entanto tenho a intuição de que, passadas a primeiras chamadas loucuras da festa que seria, teríamos enfim a experiência do mundo. Bem sei, experimentaríamos enfim em pleno a dor do mundo. E a nossa dor, aquela que aprendemos a não sentir. Mas também seríamos por vezes tomados de um êxtase de alegria pura e legítima que mal posso adivinhar. Não, acho que já estou de algum modo adivinhando porque me senti sorrindo e também senti uma espécie de pudor que se tem diante do que é grande demais."



Clarice Lispector

De todos os hábitos a que nos entregamos,

um reina sobre todos os outros no que se refere a malefícios quanto ao mundo futuro. É o hábito de ter chefes. O medo das responsabilidades, o gosto de se encostar aos outros, o jeito mais fácil de não ter que decidir os caminhos, fizeram com que a cada instante lancemos os olhos à nossa volta em busca do sinal que nos sirva de guia.
Quando surge uma dificuldade de carácter colectivo, a primeira ideia é a de que devia surgir um homem que tomasse sobre os seus ombros o áspero martírio de ser chefe. Pois bem: pode ser que isso tenha trazido grandes benefícios noutras crises da História; nem vale por outro lado a pena perguntar o que teria sido da dia História se outras se tivessem apresentado as circunstâncias.
Mas, na presente, a verdadeira salvação só virá no dia em que cada homem se convencer que tem que ser ele o seu chefe. Ou, dentro dele, Deus.

Agostinho da Silva, Só Ajustamentos, 1962.

4.10.06

Compaixão e Sabedoria

Certa vez um camponês encontrou uma cobra quase morta no seu arrozal. Vendo o sofrimento da cobra, encheu-se de compaixão. Apanhou-a e levou-a para casa.
Deu-lhe então leite morno e envolveu-a num cobertor macio. Colocou-a amorosamente ao lado dele na cama quando foi dormir. Pela manhã, o camponês estava morto.

Porque morreu? Porque usou apenas de compaixão mas não de sabedoria.
Se pegares numa cobra há grande possibilidade que ela te morda. Quando encontrares uma maneira de salvar a cobra sem a segurar estarás a equilibrar sabedoria e compaixão, e ambos ficarão felizes.

Compaixão e sabedoria deverão andar juntas. Ter uma sem a outra é como andar ao pé-coxinho. Podes saltar algumas vezes, mas acabarás por cair. Equilibrando as duas, andarás muito bem, atempada e elegantemente, passo a passo.


"Que a paz seja o teu objectivo
Que o amor seja o teu caminho
Que a sabedoria guie os teus passos."


Histórias budistas