19.10.20

Canto ostinato

 ouvir

for all instruments and all performers

by Simeon ten Holt

16.10.20

8.10.20

An Adventure

1.
It came to me one night as I was falling asleep
that I had finished with those amorous adventures
to which I had long been a slave. Finished with love?
my heart murmured. To which I responded that many profound
     discoveries
awaited us, hoping, at the same time, I would not be asked
to name them. For I could not name them. But the belief that they
     existed–
surely this counted for something?

2.
The next night brought the same thought,
this time concerning poetry, and in the nights that followed
various other passions and sensations were, in the same way,
set aside forever, and each night my heart
protested its future, like a small child being deprived of a favorite toy.
But these farewells, I said, are the way of things.
And once more I alluded to the vast territory
opening to us with each valediction. And with that phrase I became
a glorious knight riding into the setting sun, and my heart
became the steed underneath me.

3.
I was, you will understand, entering the kingdom of death,
though why this landscape was so conventional
I could not say. Here, too, the days were very long
while the years were very short. The sun sank over the far mountain.
The stars shone, the moon waxed and waned. Soon
faces from the past appeared to me:
my mother and father, my infant sister; they had not, it seemed,
finished what they had to say, though now
I could hear them because my heart was still.

4.
At this point, I attained the precipice
but the trail did not, I saw, descend on the other side;
rather, having flattened out, it continued at this altitude
as far as the eye could see, though gradually
the mountain that supported it completely dissolved
so that I found myself riding steadily through the air–
All around, the dead were cheering me on, the joy of finding them
obliterated by the task of responding to them–

5.
As we had all been flesh together,
now we were mist.
As we had been before objects with shadows,
now we were substance without form, like evaporated chemicals.
Neigh, neigh, said my heart,
or perhaps nay, nay–it was hard to know.

6.
Here the vision ended. I was in my bed, the morning sun
contentedly rising, the feather comforter
mounded in white drifts over my lower body.
You had been with me–
there was a dent in the second pillowcase.
We had escaped from death–
or was this the view from the precipice?

–Louise Glück, Faithful and Virtuous Night, 2014

1.10.20

Ela vive unicamente assegurada por uma desmesurada confiança. Nesse sentido, a fé tem a forma de uma hipótese. A fé é expectativa. Caminhamos às apalpadelas, como se víssemos o invisível, segundo a bela formulação da Carta aos Hebreus (Heb 11,7).

José Tolentino Mendonça, A Mística do Instante. O tempo e a promessa.

Mas acho que é belo lutar. Não é das alegrias e dos prazeres que um homem se orgulha. Só o tornam orgulhoso e contente do fundo da alma as dificuldades corajosamente vencidas e os sofrimentos pacientemente suportados. Mas sobre isto ninguém gosta de falar muito.

Robert Walser, O Passeio

Não sou mais do que um que escuta e que espera, mas neste papel sou perfeito, porque aprendi a sonhar enquanto espero.

Robert Walser, Geschwister Tanner

21.9.20

... ao te observares na tua vida diária com um interesse desperto e intenção de compreender em vez de julgar, em total aceitação do que possa emergir, porque já aqui está, encorajas o profundo a vir à superfície, e encorajas a tua vida e a tua consciência a enriquecerem-se com as energias que se encontravam aprisionadas. Este é o grande trabalho da atenção. A atenção remove obstáculos e liberta energias ao trazer entendimento acerca da natureza da vida e da mente. A inteligência é a porta para a liberdade e a atenção desperta é a mãe da inteligência.

Nisargadatta Maharaj

10.9.20

Senhor Poeta

do Zeca Afonso

versão de João Afonso & Luís Galrito com o Barco do Diabo

E todas as outras versões!


Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é


"Dom de iludir", Caetano Veloso

31.8.20

You become

Your beliefs become your thoughts,

Your thoughts become your words,

Your words become your actions,

Your actions become your habits,

Your habits become your values,

Your values become your destiny.


― Mahatma Gandhi

Não é fácil para os humanos compreenderem que os frutos da inteligência procedem do Amor. Penso que uma definição essencial da inteligência seria: A capacidade afetiva de estabelecer conexões com a vida e relacionar a identidade pessoal com a identidade do Universo.

Rolando Toro Araneda

30.8.20

Provérbio

Smooth seas do not make skilful sailors.

5.8.20

Não deixaremos de explorar, e a
finalidade de toda a nossa exploração
será chegarmos aonde começámos
e conhecer esse local pela primeira vez.

T. S. Elliot, "Os quatro quartetos"

22.7.20

No matter what your ability is, effort is what ignates that ability and turns it into an accomplishment. Effort is one of those things that gives meaning to life. Effort means you care about something, that something is important to you and you are willing to work for it. This is something I know for a fact: You have to work hardest for the things you love most.

Carol Dweck

20.7.20

meia-noite todo o dia

Tenho a pedir-vos que não reutilizeis mais nada.
Esse edifício junto à praia, deixai-o
entregue às ruínas,
às folhas do milho,
ao ar salgado.

Que as crianças possam tropeçar nas lajes soltas
e no átrio ecoe, como uma pedreira,
o desejo de muitas mãos.

Deixai dormir as mariposas dentro de lâmpadas partidas
e as formigas engrossarem pelos cantos
como sal.

Não inventeis mais nada,
nem formas eloquentes de evitar que o bronze oxide.
Aceitai o suor do tempo.

Que algumas coisas apodreçam.
Que os elefantes atravessem a planície.
Que as veias rebentem
do esforço de permanecer em pé.

E que nem tudo se sustente como a rosa
se sustenta de florir.

Deixai, deixai os vários pisos incomunicáveis,
o desvão ser cortejado pelo giz dos aviões,
que a lua pouse ali aberto o crânio,
que lhe bata o sol.

Ainda são precisos templos
onde o pó seja gentil
e incensado
como os pés pela caruma dos pinhais.


Andreia C. Faria em Tão bela como qualquer rapaz, Lisboa: Língua Morta, 2017, pp. 54-55.

10.7.20


A união com a Poesia e não o poema é a finalidade do poeta.

Sophia, Poesia e Realidade, 1960

14.6.20

salvar o mundo


Quando eu nasci, todos os tratados que visavam salvar o mundo já estavam escritos. Só faltava

José de Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro

6.6.20

A paz


não só é melhor do que a guerra, como é infinitamente mais difícil.


Bernard Shaw, Heartbreak House, 1919.

30.4.20

They flow


Frozen River Flows

Dobrinka Tabakova

29.4.20


Quem atravessa o perigo toca a salvação.


Hölderlin, aqui

24.4.20

Tudo sobre sedução


Para uma família ser feliz, é necessário haver sedução. Os filhos têm de ser charmosos para encantar os pais, os pais têm de se esforçar para educar convincentemente os filhos. E marido e mulher, caso queiram permanecer juntos, têm de passar a vida a engatar-se. O mal da família é pensar que aquele amor já é um assunto arrumado.

Miguel Esteves Cardoso, citado por Magda Gomes Dias, aqui

23.4.20

... para não confundir o espelho dos nossos desejos com a ponta do nosso nariz.

roubado daqui

1.4.20

Changes,

however radical they may be, never manage to completely extinguish that which is permanent.

António Barreto

20.3.20



Fairy tales are more than true: not because they tell us that dragons exist, but because they tell us that dragons can be beaten

(Gaiman, in Caroline, 2006, p.5).

24.1.20


na certeza de ser o conhecimento o mais potente dos afectos

Rosa Soares Nunes

18.1.20

roubado

Tu sabes o que é uma janela, Maria? Uma janela abre para fora, não é? É o que tu dizias há pouco quando eu te escutei. Mas uma janela também abre para dentro, Maria. Uma janela abre sempre para os dois lados. E de um lado e de outro estão as coisas.

José Augusto França, Azazel, 1956

13.11.19

Health Poem


Health is not bought with a chemist’s pills
Nor saved by the surgeon’s knife
Health is not only the absence of ills
But the fight for the fullness of life.

Piet Hein

29.10.19


Todo homem deve fazer o que lhe cabe:
nem afligir-se, nem queixar-se.

Sir Gawain e o Cavaleiro Verde, autor desconhecido

15.10.19

Avalanche


Well I stepped into an avalanche,
It covered up my soul;
When I am not this hunchback that you see,
I sleep beneath the golden hill.
You who wish to conquer pain,
You must learn, learn to serve me well.
You strike my side by accident
As you go down for your gold.
The cripple here that you clothe and feed
Is neither starved nor cold;
He does not ask for your company,
Not at the centre, the centre of the world.
When I am on a pedestal,
You did not raise me there.
Your laws do not compel me
To kneel grotesque and bare.
I myself am the pedestal
For this ugly hump at which you stare.
You who wish to conquer pain,
You must learn what makes me kind;
The crumbs of love that you offer me,
They're the crumbs I've left behind.
Your pain is no credential here,
It's just the shadow, shadow of my wound.
I have begun to long for you,
I who have no greed
I have begun to ask for you,
I who have no need.
You say you've gone away from me,
But I can feel you when you breathe.
Do not dress in those rags for me,
I know you are not poor
You don't love me quite so fiercely now
When you know that you are not sure,
It is your turn, beloved,
It is your flesh that I wear.
Leonard Cohen

23.8.19

Chega-se mais facilmente a Marte

neste tempo do que ao nosso próprio semelhante.

Saramago, Caderno VI
Open your arms if you want to be held.

Rumi

2.8.19


Contar os dias pelos dedos
e encontrar a mão cheia.

José Saramago, Cadernos de Lanzarote

13.6.19

O importante, disse-o um dia a alguém que me pedia conselho, é ser-se o que se é e tornar-se contagioso. A primeira responsabilidade que nos assiste é saber o que se é: continuo convencido que todos nós nascemos com uma partitura na cabeça. Depois, tantas vezes, ou porque nos faltou mestre de música, ou porque não encontramos piano à mão, vamos-nos entretendo a tocar coisas que não são da nossa partitura. Há então que fazer o esforço, individual ou colectivo, de achar o mestre e o piano que a partitura exige. Conseguido isso, devemos tornar-nos contagiosos.
Agostinho da Silva, Entrevista (com a participação de Joel Serrão, João Lopes Alves, Nuno Nabais, António Braz Teixeira e José Pedro Serra), in DISPERSOS, p. 68.; roubado do Facebook.

7.6.19

To everyone

has God entrusted all

ACIM

16.5.19

Gota de água


Eu, quando choro,
não choro eu.
Chora aquilo que nos homens
em todo o tempo sofreu.
As lágrimas são as minhas
mas o choro não é meu.

9.5.19


Em pleno inverno, aprendi, finalmente, que existia em mim um verão invencível.

Albert Camus

3.5.19


...o mundo não só me assustaria se eu me tornasse o mundo. Se eu fosse o mundo, não teria medo. Se somos o mundo, somos movidos por um radar delicado que nos guia.

Clarice Lispector, citada no texto de apresentação do Fúria, Dias da Dança, 2019, Porto.

31.3.19

Uma aventura


O tipo de conversa em que estou interessado é aquele que iniciamos na disposição de nos tornarmos uma pessoa ligeiramente diferente quando terminamos. É sempre uma experiência cujos resultados não são garantidos. Envolve risco. É uma aventura em que nos dispomos a cozinhar o mundo juntos para o tornar menos amargo.

Elogio da conversa, Theodore Zeldin, 2000.

17.3.19


All questions asked in this world are but a way of looking, not a question asked.

ACIM

6.3.19


remember this, girl.
you are half sea.

no one ever asks
the ocean to quiet her storm
so why do you keep
apologizing for yours?

~ pavana reddy, in makerswomen

20.2.19

as they say


ouvir

There was a time when life was in the air
Our innocence like perfume everywhere
We all listen to the autumn leaves
Tell us stories from the summer breeze

There was a time when we were princes in the snow
We went places that people just don't know
We had followed rivers to the seas
Listening to all that summer breeze

But all, all, all
We could all run away
But all, all, all
Only dreamers
as they say

Can you still feel it on your tongue
The taste of life
That'll will always keep us young
We are like the fruits among the trees
Growing with that same old summer breeze
But all, all, all
We could all run away
But all, all, all
Only dreamers

as they say

"Dreamers", Claire Denamur


5.2.19

As palavras

não significam nada se não forem recebidas como
um eco da vontade de quem as ouve

Agustina Bessa-Luís

4.2.19

...
beijam-se soluçam baixo e enfrentam a hostilidade noturna
É preciso encontrá-los. É indispensável descobri-los
Escutem cuidadosamente a todas as portas antes de bater
É possível que cantem
Mas defendam-se de entender a sua voz. Alguém que os escutou
deixou cair as armas e mergulhou nas mãos o rosto banhado de
lágrimas
...

“A invenção do amor”, Daniel Filipe

Meditação do Duque de Gandia sobre a morte de Isabel de Portugal


Nunca mais 
A tua face será pura, limpa e viva 
Nem o teu andar como onda fugitiva 
Se poderá nos passos do tempo tecer. 
E nunca mais darei ao tempo a minha vida. 

Nunca mais servirei Senhor que possa morrer. 
A luz da tarde mostra-me os destroços 
Do teu ser. Em breve a podridão 
Beberá os teus olhos e os teus ossos 
Tomando a tua mão na sua mão. 

Nunca mais amarei quem possa viver 
Sempre. 
Porque eu amei como se fossem eternos 
A glória, a luz e o brilho do teu ser, 
Amei-te em verdade e transparência 
E nem sequer me resta a tua ausência, 
És um rosto de nojo e negação 
E eu fecho os olhos para não te ver. 

Nunca mais servirei Senhor que possa morrer. 

Sophia

30.1.19

Por Delicadeza


Bailarina fui
Mas nunca dançei
Em frente das grades
Só três passos dei

Tão breve o começo
Tão cedo negado
Dançei no avesso
Do tempo bailado

Dançarina fui
Mas nunca bailei
Deixei-me ficar
Na prisão do rei

Onde o mar aberto
E o tempo lavado?
Perdi-me tão perto
Do jardim buscado

Bailarina fui
Mas nunca bailei
Minha vida toda
Como cega errei

Minha vida atada
Nunca a desatei
Como Rimbaud disse
Também eu direi:

«Juventude ociosa
Por tudo iludida
Por delicadeza
Perdi minha vida»

Sophia, O Nome das Coisas, 1977

19.1.19

uma coisa a menos para adorar


Já vi matar um homem
é terrível a desolação que um corpo deixa
sobre a terra
uma coisa a menos para adorar
quando tudo se apaga
as paisagens descobrem-se perdidas
irreconciliáveis
entendes por isso o meu pânico
nessas noites em que volto sem razão nenhuma
a correr pelo pontão de madeira
onde um homem foi morto
arranco como os atletas ao som de um disparo seco
mas sou apenas alguém que de noite
grita pela casa
há quem diga
a vida é um pau de fósforo
escasso demais
para o milagre do fogo
hoje estive tão triste
que ardi centenas de fósforos
pela tarde fora
enquanto pensava no homem que vi matar
e de quem não soube nunca nada
nem o nome

José Tolentino Mendonça

8.12.18

Viver a imperfeição


aceitar viver a imperfeição?

viver para aprender a amá-la?

6.12.18


Árvore rumorosa pedestal da sombra
sinal de intimidade decrescente
que a primavera veste pontualmente
e os olhos do poeta de repente deslumbra

Receptáculo anónimo do espanto
capaz de encher aquele que direito à morte passa
e no ar da manhã inconsequentemente traça
o rasto desprendido do seu canto

Não há inverno rigoroso que te impeça
de rematar esse trabalho que começa
na primeira folha que nos braços te desponta

Explodiste de vida e és serenidade
e imprimes no coração mais fundo da cidade
a marca do princípio a que tudo remonta

Ruy Belo