29.11.12


Eterno é este instante, o dia claro,
as cores das casas desenhadas em aguada rasa,
castanhos e vermelhos quase em declive,
as janelas limpíssimas, os vidros muito honestos.
este instante que foi e já não é, mal pousei a caneta
no papel: eterno

Sonhei contigo, acordei a pensar
que ainda eras, como é esta janela, 
como o corpo obedece a este vento quente, e é ágil, 
mas tudo: tão confuso como são os sonhos 

Agora, neste instante, recordo a sensação 
de estares, o toque. 
Não distingo os contornos do meu sonho, não sei 
se era uma casa, ou um pedaço de ar. 
A memória limpíssima é de ti 
e cobriu tudo, e trouxe azul e sol a esta praça 
onde me sento, organizada a esquadro,
como as casas 

E agora, o teu andar
acabou de passar mesmo ao meu lado, igual, 
e agora multiplica-se nas mesas e cadeiras
que cobrem rua e praça, 
e eu vejo-te no vidro à minha frente, 
mais real que este instante, e se Bruegel te visse
pintava-te, exactíssima e aqui. 
E serias: mais perto de um eterno

(Eu, que nada mais sei, só o fulgor do breve, 
eu dava-te palavras - )

Ana Amaral Dias, em Vozes, 2011.

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